quarta-feira, 25 de junho de 2008

Charmosa Cidade

A mais linda entre as cidades. Esta é São Filipe, minha terra, a mãe de todos os meus sonhos.
Acanhada, ela olha sempre para longe, para o imenso oceano, tão azul quanto os sonhos dos que nela moram, sempre à espera que um navio traga uma esperança distante, um sonho há muito esquecido.
Quisera eu que fosses mulher, linda, pois assim todos os teus filhos a ti dedicariam os seus mais perfeitos versos, escritos sempre sob a fúria pujante da saudade.
Difícil é não sentir saudades de tuas pracinhas lindas, arrumadas de forma a que suas imagens se entranhem no mais profundo giro de nossos cérebros.
Teu cheiro, numa manhã de chuva, sempre há de estimular cada receptor olfativo existente no mais profundo do nosso inconsciente.
É tudo perfeito.
É manhã. Já os carros começam a chegar pelas poucas e estreitas ruas que desembocam quase todas no largo de Cruz de Paz. E todos sentem a paz da cidade, acolhendo cada um como filho amado, repassando coragem para enfrentar mais um dia cheio, de trabalho e alegria.
Meio-dia. As crianças acabam de sair das escolas, correm livres pelas ruas. Os adolescentes saem do licéu, mas nem todos seguem para suas casas, alguns esperam os carros que os levarão de volta para seus lares no interior, outros ainda vão para o prisídio encontrar seus amores, os seus únicos amores, até que descubram que vários outros únicos amores hão de aparecer em suas vidas. Nesse tempo que passou, acelerado por entre os muitos beijos apaixonados, passam outros alunos que entrarão agora à tarde, vamos rápido que o sino já tocou e o chefe de turma nos marcará falta de atraso, dizem uns aos outros, mesmo sem palavras.
Final do dia. Para alguns, a hora mais esperada. É a hora de dar vida à paixão escondida, é o momento de ganhar coragem para se declarar ao seu amor. Não perca tempo, olha para os lados e verás a cara de felicidade dos muitos que já se declararam e agora, na parte mais escura do 'polivalente', se entregam sem medo aos beijos e a outras coisas mais, das quais não podemos falar agora, olha a hora. Nós não. Eles sim, principalmente ele, que há muito vem fazendo propostas mais assanhadas a ela, que louca de vontade está, mas que resiste bravamente. Puro charme. Não demorará muito e todos nós ouviremos suas histórias picantes nos intervalos no licéu. Sempre há o que fica escondido vendo tudo, graças a Deus, pois sem esses o que seria de nós, 'patos' inveterados?! Esses são nossos verdadeiros hérois.
As mulheres de São Filipe sempre intimidaram a maioria de nós adolescentes, elas são tão desinibidas, sempre dois ou três passos na nossa frente. Por isso nós nutríamos um ódio latente, não apenas por elas, principalmente pelos garotos mais velhos, os sonhos de consumo delas, esses 'fumadores de padjinha', como os chamávamos, na tentativa infrutífera de nos vingar. Impossível, eles sempre namoravam as mais desejadas e, necessariamente, desejáveis.
Talvez seja por isso que começamos a reparar mais na mulheres do interior. Não por serem menos belas, elas são lindíssimas. Mais até que as da cidade. Talvez por terem um charme natural, não camuflado pela máscara das mulheres da cidade. Hoje acho que esse charme advém da impressão intrínseca de ingenuidade que elas carregam. Privilégio delas. Quem as conhece mais intimamente diz que, em boa verdade, é só impressão, que os ingénuos somos nós os homens. Por isso desisti de tentar entender as mulheres, temos que aceitá-las como são. Deus, depois que fez a mulher, olhou para sua obra e viu que era tudo 'muito bom'. Quem somos nós para discordar?!
Começa outro dia. É manhã. Já os carros começam a chegar pelas poucas e estreitas ruas...e assim desenrola a vida na mais charmosa das cidades, São Filipe, a mãe de todos os meus sonhos.

Aquele abraço
Eliezer Monteiro - Rio de Janeiro

5 comentários:

Oscar N. Gomes disse...

Kel omi, es post li sta dodu mos... Djel pon ku sodadi nos terra, ma tanbe fazen lenbra grandis tenpus di San Filipi.

Dipos di kel aula di tardi, ba odja kel djogu na polivalenti...

Un gosta txeu di kel post li man,
Nho kontinua, ka nho fika mo mi ku Filipe ki dja bira prigisozu.

Kel abrasu la.
OG

Burcan disse...

OK Oscar. Ka tem komo du ka sinti sodadi hora ki du papia sobre nôs tempu sabi na djarfogu. Kel abrason pa nho.

Anônimo disse...

Excelente!!! Enquanto lia, via-me, há uns anos, andando guiado pelas frases sabiamente escritas!
Meu amigo, vejo em ti um talento enorme. Porque não explora-lo?
A tua forma de exprimir a prosa poética é muito distinta e melodiosa!

Sem deixar de valorizar o teu talento, reconheço que a fonte inspiradora também impele uma veia poética em qualquer um!
A nossa cidade, a nossa ilha, a nossa gente, genuinamente belas!

Amigo, este texto soube-me tão bem, tão bem mesmo...parece que foi encomendada por mim para relatar uma nostalgia, uma saudade que me vai na alma!!!

Burcan disse...

João nha kumpá. Obrigado pa palavras di nho, um colega respeitadíssimo por mim. Foi nhas humildes palavras sobre nôs terra. Nho é otu leitor ki ta dan txeu honra, sima oscar, lek, filipe e todos os outros.
Abraço grande pa nho.

Anônimo disse...

Gostei mesmo amigo! Continua a escrita, tens mesmo muito jeito para isso!
Eu dou-me melhor com a poesia...
Estou a tentar publicar meus poemas mas há muitos entraves...

Vai um abraço amigo de sempre!